quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Sempre me deixou estupefacta a arte da tecelagem. Os gestos repetitivos, a mesma figura exausta e sem entusiasmo que se entrelaça naquelas lãs também. Nunca pude deixar de imaginar o percurso dos minúsculos pedaços de lã que se espalham pela sala (aqueles que provocam comichão no nariz).

Começavam por se afastar da tela, rastejando humilde e silenciosamente até aos pulsos da desatenta donzela (pela mão passavam depressa pela sua movimentação maquinal). Depois detinham-se, na face interna, doce e delicadamente, para tentar provocar algum pequeno esgar de prazer à trabalhadora. Ignoradas, seguiam caminho pelo braço, cotovelo, apanhavam o atalho pelo decote da jovem e arranhavam o seu colo rude e seco. Foi fácil continuar a subir pelas precoces rugas que lhe percorriam toda a cara e entrar-lhe gentilmente pela comissura da boca. Aaaah, e deleitaram-se a pensar em tudo o que iriam encontrar.

Mas... Depois de um longo percurso, perceberam então que existia um novelo de lã enrolado diligentemente ao seu coração e que o impedia de sentir. Tinham abandonado o tapete para viver dentro de outro ser morto.

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