quarta-feira, 17 de agosto de 2011
Sophie Calle - Le mail de Prenez soin de vous
Sophie,
Cela fait un moment que je veux vous écrire et répondre à votre dernier mail. En même temps, il me semblait préférable de vous parler et de dire ce que j'ai à vous dire de vive voix. Mais du moins cela sera-t-il-ecrit. Comme vous lávez vu, jállais mal tous ces derniers temps. Comme si je ne me retrouvais plus dans ma propre existence. Une sorte d'angoisse terrible, contre laquelle je ne peux pas grand-chose, sinon aller de l'avant pour tenter de la prendre de vitesse, comme j'ai toujours fait. Lorsque nous nous omes rencontrés, vous aviez posé une condition: ne pas devenir la "quatrième". J'ai tenu cet engagement: cela fait des mois que j'ai cesé de voir "les autres, ne trouvant évidement aucun moyen de les voir sans faire de vous l'une d'elles.
Je croyais que cela suffirait, je croyais que vous aimer et que votre amour suffiraient pour que l'angoisse qui me pousse toujours À aller voir ailleurs et m'empêche à jamais d'être tranquile et sans doute simplement heureux et "généreux" se calmerait à votre contact et dans la certitude que l'amour que vous me portez était le plus bénéfique pour moi, le plus bénéfique que j'ai jamais connu, vous le savez. J'ai cru que L'I... serait un remède, mon "intranquilité" s'y dissolvant pour vous retrouver. Mais non. C'est même devenu encore pire, je ne peux même pas vous dire dans quel état je me sens en moi-même. Alors, cette semaine, j'ai commencé à rappeler les "autres". Et je ne sais ce que cela veut dire pour mooi et dans quel cycle cela va m'entrainer.
Je ne vous ai jamais menti et ce n'est pas aujourd'hui que je vais commencer.
Il y avait une autre règle que vous aviez posée au debut de notre histoire: le jour où nous cesserions d'être amants, me voir ne serait plus envisageable pour vous. Vous savez come cette contrainte ne peut que me parître désastreuse, injuste (alores que vous vouyez toujours B., R., ...) et compréhensible (évidement...); ainsi je ne pourrais jamais devenir votre ami.
Mais aujourd'hui, vous pouvez mésurer l'importance de ma décision au fait que je sois prêt à me plier à votre volonté, alors que ne plus vous voir ni vous parler ni saisir votre regard sur les choses et les êtres et votre douceur sur moi me manqueront infiniment.
Quoi qu'il arrive, sachez que je ne cesserai de vous aimer de cette manière que fut la mienne dès que je vous ai connue et qui se prolongera en moi, je le sai, ne mourra pas.
Mais aujourd'hui, ce serait la pire des mascarades que de mantenir une situation que vous savez celui que vous me portez et qui m'oblige encore à cette franchise envers vous, comme dernier gage de ce qui fut enntre nous et restera unique.
J'aurais aimé que les choses tournent autrement.
Prenez soin de vous.
G.
quarta-feira, 3 de agosto de 2011
Diogo - O grande
não morrerei sem me tornar absolutamente
incompreensível.
Rui Nunes
Há um som que espera, cresce,
raro e disperso desde a pesada manhã que nos
apanhou juntos. O sol ainda entra por lá
num desenho inábil,
a luz, aos poucos, sacudindo o assombroso
abandono do que deixámos pelo chão.
Lembro o silêncio que nos criou,
e como nos educámos. Café, cigarros, à espera
das vozes. Um ânimo subtil e a força
das paisagens que tu querias
e eu pude descrever.
Tenho atalhos, a cidade, tenho-a
toda anotada, sei de cor as manias, manhas,
truques, inclinações. Respiram pela minha
boca todas as suas figuras de pedra e passado.
Chego hoje mais cedo ao Café
a oferecer-me para pagar. Reúno pequenas
tripulações, e o mar é essa violência
das escolhas que não fizemos.
Cá estamos, embrutecidos, mudos,
remando no escuro, descompassadamente
e sem qualquer sentido.
Muitas vezes uso só um banco e um jardim,
quieto, calado. Outras, de longe, aceno,
ou agarro um braço por provocação, solto-o
de imediato como se não fosse nada –
não é nada, desculpe –, tem graça
como isso basta e é terrível, inaceitável.
Ou apresento-me, sempre outro e sempre
dou outro nome, quaisquer sons que me
trepem a garganta e se juntem. Isso,
sou eu.
Vale muito e tão pouco o meu tempo.
Tu precisas de bem menos, diferente
assim que acordas. Que olhos e que cor
essa a que chegam. Castanhos, mas tantos,
todos de uma força vagabunda.
Teu espelho sempre minucioso, grave,
e esse gato severo que te quer e me
rejeita de todas as vezes.
Talvez pudesse ter mais no nome,
mais quem se agarrasse a ele pelas noites,
mas prefiro ser só um passageiro, ficar mudo,
no escuro, sentado bem lá ao fundo.
Já o teu nome chega às vezes a ser pouco
para chamar-te, desfaz-se-me na boca
sem nem deixar gosto
e então chamo-te tudo. Vomito
este medonho idioma: gemidos,
bramidos, gritos sufocados; ou
a melodia mínima dos dentes, batendo.
Amaldiçoo o sangue e a hora, faço
da pele uma espera, marco-a sempre
que mais não é possível.
Tenho-me em silêncio, defendido, sou outra
dessas circunstâncias absurdas, tantas vezes
o instante exacto em que as coisas
começaram a correr mal. A ti, tenho-te
medida em segundos, mesmo a
hesitação, sei as frases de que gostas, repito-as,
tiro-lhes tudo.
Carne infeliz esta que no final de cada dia
deito à beira do sonho,
esse corpo quebrado em delicadezas.
E uso a noite, agito-te o sono. Às tantas
acordas sem nome. E o teu quarto
é a reedição, revista e aumentada,
de um desastre antigo. Cansaço. Ao canto
a minha flor escura, chupada, toda ela
de uma lentidão que castiga o olhar.
O ar cai em volta sem compreender, fede.
As sombras, do mesmo tamanho todas,
e de um horror que vem brincar connosco.
Agarro-me, tenho uma ideia, toda a noite
a mesma ideia, baloiçando-se, contando
pulsações. Escrevo-lhes por cima,
aperfeiçoo uma melodia que te destrua.
É fácil abusar silenciosamente
de alguém, mas isto… Pausa a pausa,
dou-te o que quiseres, o tempo todo
para me olhares nos olhos e continuares
sem entender.
Fecho dias em casa, num lúcido estupor,
a luz doseada, alimento a soro
as frágeis impressões do meu exílio.
E gosto disto,
de tudo o que me sai. Sou fácil.
Satisfaço-me, sou sinceramente simples,
e cintilado, sou esta deslocação de um vazio,
um frémito que escreve,
lê. Leio, pior cada vez, cada vez
mais tarde, tão depois de tudo,
e desentendo-me com todos eles,
cada um dos meus autores. Fico ali
meio na provocação, faço-lhes as traduções
mais abusadas. O pior leitor.
Prefiro de longe
quando fraquejam, sempre que foi
por pouco, passo mais com eles aí. Adoro-os
se ficam subitamente
indecisos, e então escolho eu por eles.
E subo-lhes os muros, salto-lhes
para dentro das noites que deixaram
em branco. Cheiro-os. Mijo-lhes as flores,
assusto o gato, jogo, deito, atiro coisas
ao chão, sorrio, ponho-me de lado com a cabeça
a fazer que não.
Sou o outro animal, essa inclinação
maligna, este que chega anos mais tarde,
quando já ninguém esperava, seguindo
o mau cheiro, venho pelo gosto exausto
das coisas, sentir na carne os espantosos
lábios de um moribundo.
incompreensível.
Rui Nunes
Há um som que espera, cresce,
raro e disperso desde a pesada manhã que nos
apanhou juntos. O sol ainda entra por lá
num desenho inábil,
a luz, aos poucos, sacudindo o assombroso
abandono do que deixámos pelo chão.
Lembro o silêncio que nos criou,
e como nos educámos. Café, cigarros, à espera
das vozes. Um ânimo subtil e a força
das paisagens que tu querias
e eu pude descrever.
Tenho atalhos, a cidade, tenho-a
toda anotada, sei de cor as manias, manhas,
truques, inclinações. Respiram pela minha
boca todas as suas figuras de pedra e passado.
Chego hoje mais cedo ao Café
a oferecer-me para pagar. Reúno pequenas
tripulações, e o mar é essa violência
das escolhas que não fizemos.
Cá estamos, embrutecidos, mudos,
remando no escuro, descompassadamente
e sem qualquer sentido.
Muitas vezes uso só um banco e um jardim,
quieto, calado. Outras, de longe, aceno,
ou agarro um braço por provocação, solto-o
de imediato como se não fosse nada –
não é nada, desculpe –, tem graça
como isso basta e é terrível, inaceitável.
Ou apresento-me, sempre outro e sempre
dou outro nome, quaisquer sons que me
trepem a garganta e se juntem. Isso,
sou eu.
Vale muito e tão pouco o meu tempo.
Tu precisas de bem menos, diferente
assim que acordas. Que olhos e que cor
essa a que chegam. Castanhos, mas tantos,
todos de uma força vagabunda.
Teu espelho sempre minucioso, grave,
e esse gato severo que te quer e me
rejeita de todas as vezes.
Talvez pudesse ter mais no nome,
mais quem se agarrasse a ele pelas noites,
mas prefiro ser só um passageiro, ficar mudo,
no escuro, sentado bem lá ao fundo.
Já o teu nome chega às vezes a ser pouco
para chamar-te, desfaz-se-me na boca
sem nem deixar gosto
e então chamo-te tudo. Vomito
este medonho idioma: gemidos,
bramidos, gritos sufocados; ou
a melodia mínima dos dentes, batendo.
Amaldiçoo o sangue e a hora, faço
da pele uma espera, marco-a sempre
que mais não é possível.
Tenho-me em silêncio, defendido, sou outra
dessas circunstâncias absurdas, tantas vezes
o instante exacto em que as coisas
começaram a correr mal. A ti, tenho-te
medida em segundos, mesmo a
hesitação, sei as frases de que gostas, repito-as,
tiro-lhes tudo.
Carne infeliz esta que no final de cada dia
deito à beira do sonho,
esse corpo quebrado em delicadezas.
E uso a noite, agito-te o sono. Às tantas
acordas sem nome. E o teu quarto
é a reedição, revista e aumentada,
de um desastre antigo. Cansaço. Ao canto
a minha flor escura, chupada, toda ela
de uma lentidão que castiga o olhar.
O ar cai em volta sem compreender, fede.
As sombras, do mesmo tamanho todas,
e de um horror que vem brincar connosco.
Agarro-me, tenho uma ideia, toda a noite
a mesma ideia, baloiçando-se, contando
pulsações. Escrevo-lhes por cima,
aperfeiçoo uma melodia que te destrua.
É fácil abusar silenciosamente
de alguém, mas isto… Pausa a pausa,
dou-te o que quiseres, o tempo todo
para me olhares nos olhos e continuares
sem entender.
Fecho dias em casa, num lúcido estupor,
a luz doseada, alimento a soro
as frágeis impressões do meu exílio.
E gosto disto,
de tudo o que me sai. Sou fácil.
Satisfaço-me, sou sinceramente simples,
e cintilado, sou esta deslocação de um vazio,
um frémito que escreve,
lê. Leio, pior cada vez, cada vez
mais tarde, tão depois de tudo,
e desentendo-me com todos eles,
cada um dos meus autores. Fico ali
meio na provocação, faço-lhes as traduções
mais abusadas. O pior leitor.
Prefiro de longe
quando fraquejam, sempre que foi
por pouco, passo mais com eles aí. Adoro-os
se ficam subitamente
indecisos, e então escolho eu por eles.
E subo-lhes os muros, salto-lhes
para dentro das noites que deixaram
em branco. Cheiro-os. Mijo-lhes as flores,
assusto o gato, jogo, deito, atiro coisas
ao chão, sorrio, ponho-me de lado com a cabeça
a fazer que não.
Sou o outro animal, essa inclinação
maligna, este que chega anos mais tarde,
quando já ninguém esperava, seguindo
o mau cheiro, venho pelo gosto exausto
das coisas, sentir na carne os espantosos
lábios de um moribundo.
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